O Natal dos ursos

Quando chega a Primavera e eu acordo do meu longo sono de Inverno, escondida na minha gruta preferida, já a floresta está cheia de turistas que assim que vêem um raio de Sol vão logo fazer piqueniques.
Os guardas-florestais bem nos avisam para não nos aproximarmos das pessoas. Mas as comidas deles são tão cheirosas que o meu faro apurado não resiste e quando dou por isso já estou ao pé delas.
A minha mãe ensinou-me a ficar sossegada atrás dos arbustos para as pessoas não nos verem. Por muitos avisos que os guardas-florestais lhes façam há sempre um momento em que deixam a comida nas mesas e descem até ao rio ou vão dar um passeio à floresta.
Assim não há urso que resista, e o piquenique das pessoas passa a piquenique dos ursos. Ao mínimo ruído, fugimos dali para fora, também não gostamos dos sermões do guarda-florestal.Num desses dias, já o Outono ia avançado, enquanto esperava escondida atrás dos arbustos, ouvi uma conversa que me deixou intrigada.
Falavam do Natal. Não sabia o que isso era mas percebi que era uma festa com muita comida, por isso prestei toda a atenção. Parece que a família se juntava toda e brincavam na neve.
Que estranho, eu hibernava exactamente para não ter de andar na neve, é muito mais difícil andar e encontrar comida.
Também falavam de muitas luzes coloridas. Fez-me lembrar as histórias que a mamã contava sobre a aurora boreal, quando o céu se enche de cores. Eu já tinha visto o arco-íris, mas não era a mesma coisa.
No último Inverno, quando me deitei a dormir na minha gruta, sonhei que atrasava a minha hibernação para poder mostrar às minhas crias o que era o Natal, com a neve e as luzes coloridas.
Mal eu sabia, que quando acordasse novamente no final de Fevereiro, já teria dois ursinhos para me fazerem companhia e me ajudarem a cumprir o meu sonho.
Eram tão pequeninos, mas cresciam tão depressa, que cedo os comecei a levar aos piqueniques das pessoas. Expliquei-lhes todos os truques para que nunca fossem apanhados pelos guardas-florestais.
Os meses iam passando enquanto lhes ensinava a colher as bagas mais doces, a chegar às larvas das abelhas sem serem picados e a apanhar os peixes mais rápidos.
Quando o mês de Dezembro chegou, eu já tinha decidido que só iríamos hibernar depois de descobrirmos o que era o Natal.
Para começar tínhamos de procurar a neve. Dirigimo-nos então para as montanhas, mas nunca mais a encontrávamos.
Cruzámo-nos com um puma que nos disse que a neve, que costumava vir do norte, ainda não tinha chegado. Portanto, fomos atrás dela.
Seguimos a floresta até a o fim, mas neve nem vê-la. Depois, só um campo sem árvores. O que seria aquilo?
Andávamos por lá a tentar perceber o que se passava quando encontrámos um urso-polar solitário. Era o primo Ben. Estava tão magro que mal o conhecia. A última vez que nos tínhamos visto éramos ainda crianças.
Explicou-nos que de ano para ano havia cada vez menos neve e chegava cada vez mais tarde. Sem gelo não conseguia caçar e já tinha tanta fome que não conseguia continuar a caminhar para norte. Partilhámos com ele o peixe e bagas que trazíamos connosco para a viagem.
Seguimos os quatro para norte à procura da neve e do gelo, percorremos caminhos e atravessámos braços de mar, mas as minhas crias também já estavam a ficar cansadas e com fome. Até que ao longe vimos um monte branco e começámos a correr. Finalmente neve.
O primo Ben estava tão cansado que já não conseguia caçar sozinho. Ensinou-nos como havíamos de esperar junto a um buraco no gelo para conseguirmos apanhar uma foca. Foi a primeira vez que caçámos algo tão grande.
Nessa noite, com a família junta, fizemos um banquete maravilhoso, enquanto víamos a aurora boreal. Aquelas cores eram ainda mais maravilhosas do que a mamã me contara.
Se o Natal que as pessoas falavam era isto – a família, as cores, a alegria e a boa comida –, então valia bem a pena ir para a gruta mais tarde todos os anos.